Dava pra ouvir o click do semáforo mudando de cor. De vermelho para verde, de verde para amarelo, de amarelo para vermelho. Tão absoluto era o silencio daquela hora da madrugada. Só de vez em quando, muito raramente, passava um carro.
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Eram 3:15 h. Madrugada de sexta-feira. De maio. De um ano que não está muito distante, dependendo do sentimento de distância. Ou de um ano que está irremediavelmente distante, como tudo que diz respeito ao passado. (Mesmo o minuto que passou - o minuto anterior ao que estamos - está inalcançávelmente distante.)
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Madrugada de uma sexta-feira. De uma época e um lugar – de uma periferia de cidade - em que só o fator “madrugada”, por si, já significava silêncio e solidão. O semáforo ficava bem em frente à entrada da maternidade, um prédio baixo, de térreo mais dois ou três andares. Lá dentro, no quarto 38, estava minha mulher.
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(Escrevo “minha mulher” no lugar de “minha esposa”. Essa escolha será, por si só, reveladora do como a vejo e até de como vejo as mulheres em geral? E até de como vejo a mim mesmo? Deve ser...)
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Mulher quase menina! Tão jovem e tão linda! Linda, radiante, repleta de um sentimento múltiplo e misturado: de cansaço, de atordoamento com os fatos da vida, de felicidade, amor, exaustão e ternura. Com uma mistura de sentimentos que só as mulheres conseguem ter, com uma intensidade de sentimentos que só uma mulher que acabara de dar à luz conseguiria ter.